A constante do futebol mostra que os maus exemplos dos atletas de elite não ameaçam seus status de craque, mas será que, em tempos de pandemia, isso deve continuar?
Manchester City Feminino // Fonte: Instagram (@lucybronze)
Em oito meses, vimos no futebol o que ocorria a nossa volta. Ninguém conseguia escapar completamente da contaminação pelo novo coronavírus, nem mesmo atletas profissionais. No Brasil, toda semana eram divulgados nomes de jogadores afastados, criando um clima de insegurança não só para o plantel, mas também para os inúmeros funcionários que participam das partidas. E tudo isso era previsível. Não seria possível criar “bolhas de controle” – como foi visto na NWSL, WNBA e, posteriormente, NBA – para o campeonato brasileiro. Para além das questões de saúde dos envolvidos, toda a problemática da contaminação atinge a logística, os compromissos. Foram muitos pedidos de adiamento de partidas oficiais e resultados positivos horas antes do jogo, o que adentrava a esfera jurídica do esporte, prejudicando o espetáculo tão necessário aos torcedores que acompanhavam de casa.
Se, então, não era viável que o clube protegesse integralmente seus atletas, tornou-se fundamental que próprios jogadores respeitassem as restrições e tentassem ao máximo se resguardar. Contudo, o que foi visto com regularidade em todo o período de isolamento social foi o desrespeito às medidas restritivas. A sociedade brasileira em si colecionou exemplos não apenas de desobediência, mas também de falta de empatia. A elite do futebol, que a cada ano parece apresentar ao público mais de suas ideologias políticas, não escaparia dos vexames. Diego Ribas, do Flamengo, passeou de bicicleta pela orla da praia, quando ainda era proibida a circulação nessa área da cidade. Marrony, do Atlético Mineiro, foi visto e confrontado em uma boate em Belo Horizonte. Osvaldo, do Fortaleza, aproveitou um final de semana – em meados de junho – para curtir as dunas cearenses.
E não foi apenas no Brasil que atletas desrespeitaram o isolamento. No final de 2020, um escândalo cercou o futebol feminino inglês. Através de postagens nas redes sociais, foi descoberto que inúmeras atletas do Manchester City, do Manchester United e do Arsenal, tais como Lucy Bronze, Katie Zelem e Katie McCabe, haviam viajado para Dubai no feriado. O episódio, apelidado de “DubaiGate”, gerou revolta nas redes sociais. Nem todas as jogadoras, que viajaram, testaram positivo, mas alguns casos de contaminação despontaram nos clubes citados, o que levou a Federação Inglesa a adiar algumas partidas. As tensões ainda se elevaram quando o Arsenal e o Manchester City emitiram notas oficiais, as quais não condenavam as atitudes de suas atletas; diferentemente do United, cuja treinadora - Casey Stone – publicamente pediu desculpas por dar permissão às jogadoras.
Os exemplos se multiplicam em uma velocidade maior do que é possível se noticiar. O esporte trouxe em 2020 muito mais do que somente uma válvula de escape para o cenário de dúvidas e restrições da pandemia. O futebol, com destaque, mostrou mais uma vez que ações individuais geram consequências ao coletivo. A vitrine posta a cada atleta profissional não deve ser usada para ver seus próprios reflexos. A população carece de bons exemplos. A função de um jogador, teoricamente, não foge de sua atuação em campo, porém a responsabilidade como cidadão não é medida por gols ou assistências. O Brasil, em especial, necessita entender que não basta ser craque em campo para ser ídolo. Essa lógica engrandeceu muitas pessoas medíocres até aqui. 2020 nos atentou a escolher com cuidado o nosso camisa 10.
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